domingo, novembro 10, 2019

A tristeza das luzes

O pinheirinho parecia estremecer ao vento. Ainda jovem, ele admirava os pais, que se elevavam até as alturas, carregados de pinhas.
À sua volta, havia pinheiros dos mais diversos tipos e tamanhos, cuidados por humanos. Recebiam toda água, iluminação e poda que eram necessárias, paparicados o tempo inteiro.
De vez em quando, um conhecido seu era levado para outro lugar e nunca mais reaparecia. Justo no tempo frio faziam isso? Será que iam ficar no meio da neve?
Mas alguns diziam que lá fora também havia um ambiente quentinho, repleto de luzes e música.
O pinheirinho ficava curioso, mas preferia permanecer ao lado da família. Se pudesse escolher.
.
Quando as pinhas apareceram pela primeira vez, ele teve vontade de se exibir para todo mundo. Os pais estavam orgulhosos e os humanos fizeram a festa, recolhendo-as não sabia para quê.
O pinheiro continuou crescendo e já quase não conhecia os que estavam ao seu redor. A maior parte tinha ido para o mundo de fantasia.
.
Até o dia em que vieram buscá-lo.
Ele estava dividido entre o medo, a tristeza e a ansiedade. Mal conseguiu se despedir.
Colocaram-no num lugar grande e escuro, num solo estranho, e um zumbido começou. Pareceu durar uma eternidade. Não conseguia esticar suas raízes, que pareciam meio dormentes.
Quando o zumbido parou, ele estava ainda meio fraco, zonzo, não acostumado à nova terra.
Surgiu uma claridade e o pinheiro se viu no tal mundo que tinham descrito. Era exatamente daquele jeito: luzes, música, cores por todo lado. Foi colocado em meio a um monte de humanos, e só então reparou que estava fixado num grande recipiente.
.
Filhotes de humanos começaram a correr em volta dele com caixas que tilintavam. Eles as abriram e começaram a pendurar em seus galhos objetos estranhos, circulares, brilhantes, alguns com formato de humanos, outros de seres que não conhecia.
Seus galhos começaram a pesar um pouco, uma humana gritou e os pequenos pararam. Ela pegou um objeto cheio de pontas e prendeu no topo do pinheiro.
Ia precisar aguentar aquelas coisas presas por quanto tempo?
.
Um humano colocou água na terra e o pinheiro se sentiu agradecido. 
Resolveram envolver nele uns ramos com luzes que piscavam e aqueciam. Então, do nada, o ambiente escureceu e só ficaram as luzes dele. O pinheiro suspirou e pegou no sono.
Quando acordou, os ramos estavam apagados, mas os objetos continuavam pendurados. Experimentou se sacudir um pouco e alguns caíram com um tilintar. Logo apareceu um filhote e colocou de volta. Não ia ser fácil.
.
Os dias se passaram e chegou o dia mais colorido, iluminado e barulhento. O lugar se encheu de humanos. Todos mexiam nele, alisando-o, como se fosse um ser estranho.
Abaixo dele, objetos coloridos e quadrados se espalhavam, olhados a todo tempo pelos filhotes. De lá saíram coisas impressionantes, que o pinheiro nunca tinha visto, atiçando sua curiosidade.
Mas ele estava cansado, meio fraco. Havia tempo não pegava um sol de verdade. Os raios mal o alcançavam.
Logo a confusão passou e ele se viu sozinho com as luzinhas.
.
Nos dias seguintes, o ambiente se tornou menos colorido, menos iluminado, mais silencioso. Então os filhotes tiraram os ramos e os objetos pendurados, para seu alívio. Ele até se sentiu meio nu.
Ninguém mais parecia lhe dar atenção.
.
Certo dia, viu que os humanos apontavam para ele, as caras sérias. Começaram a brigar, sumiram.
O pinheiro estava esgotado, angustiado. Recentemente, não o estavam regando direito.
.
Um dos humanos reapareceu e carregou seu vaso para o quintal. O pinheiro nem acreditou que pegaria sol de verdade. Ficou largado lá sozinho.
Então ouviu um zumbido, que foi aumentando de volume até surgir uma máquina que lhe despertou lembranças.
Foi colocado dentro e tudo escureceu.
.
O zumbido persistiu e embalou o sono do pinheiro.
Foi acordado com um baque alto, uma porta sendo aberta.
Ele não acreditava. Lá estavam seus pais.
Com violência, foi arrancado do vaso e plantado num buraco, que logo foi enchido de terra. Suspirou ao conseguir esticar novamente as raízes. 
Estremeceu ao vento e verteu lágrimas de orvalho.